A Nossa História do Palácio da Pena na Serra de Sintra começa assim:
“Hoje é o dia mais feliz da minha vida. Conheço a Itália, a Sicília, a Grécia e o Egipto, e nunca vi nada, nada, que valha a Pena. É a cousa mais bela que tenho visto. Este é o verdadeiro jardim de Klingsor – e, lá no alto, está o Castelo do Santo Graal.“
Richard Strauss
O homem romântico, contemporâneo da Revolução Industrial, assistiu à transição gradual de uma civilização rural para um estilo de vida fundamentalmente urbano, o qual entrou em acelerada decadência devido à forte concentração populacional e à destruição do meio ambiental.
Procurando fugir do ambiente asfixiante da vida urbana, era no reencontro com a Natureza que o homem romântico encontrava a sua alternativa de vida.
Parafraseando J. Almeida Flôr, facilmente compreendemos no que consiste, na sua essência, o Ideal Romântico, ideal este que se reflecte em todas as atitudes da Vivência Romântica:
“O cenário romântico por excelência é o da Natureza em liberdade, sobretudo naquilo que ela tem de acidental, assimétrico, incompleto e imperfeito e naquilo que ela simboliza de vitória da espontaneidade sobre a reflexão, do caos criador sobre a ordem rígida do arrebatamento dionisíaco sobre o equilíbrio apolíneo.“
Sintra, enaltecida por vários autores e peregrinos estrangeiros (Byron, Beckford e Hans C. Andersen, entre outros), significava a possibilidade de concretizar esse sonho romântico. D. Fernando II assim o entendeu, criando uma verdadeira paisagem à dimensão da imaginação romântica, donde sobressai o recorte majestoso e sereno do Palácio da Pena, a coroar a Serra de Sintra.
O Palácio da Pena e os jardins foram concebidos como um todo: as influências que conduziram à realização sublime de um, encontram-se no outro.
“O Mosteiro gótico da Pena despiu-se então da simplicidade monástica para trajar as galas do século; deixou a divisa dos filhos de S. Jeronymo para se ataviar com o brasão d’armas de Portugal e Goburgo; trocou os seus dormitórios e estreitas celas por espaçosas salas; e mudou o nome humilde de habitação de monges no título pomposo de Paço Real.“
“Depois, o augusto restaurador do monumento manuelino acrescentou às antigas obras outras novas e muito mais esplêndidas. A par do velho edifício rejuvenescido, levantou-se, como por efeito de condão mágico, um soberbo e formosíssimo palácio, uma verdadeira mansão de fadas.“
“E uma grande extensão de Serra, em volta do paço, adquirida em diversas ocasiões pelo real fundador, foi transformada em um magnífico parque, a cuja traça e plantação tem presidido o mais apurado gosto“
(lnácio de Vilhena Barbosa, Parorama Photoqraphico de Portugal, 1873).
O Palácio da Pena apresenta, pois, uma atitude vanguardista e inovadora no modo como concilia e recupera os valores arquitectónicos nacionais de diferentes épocas.
Durante a construção, apesar de se manter a estrutura básica, foram feitas alterações em quase todos os vãos, ao mesmo tempo que a pequena torre cilíndrica que se encostava à maior passou para a retaguarda do edifício. O arco do corpo, ladeado por duas torres, recebeu uma profusa decoração em relevo a imitar corais.
Sobre ela, uma janela, a “bow window”, recebeu na sua base, também em relevo, uma figura de um ser híbrido, meio-peixe, meio-homem, saindo de uma concha com a cabeça coberta por cabelos que se transformam num tronco de videira cujos ramos são sustentados pela enigmática personagem, relembrando propositadamente o homem barbado da janela da sala do coro do Convento de Cristo em Tomar, transformado aqui num ser monstruoso de carácter quase demoníaco.
Este conjunto, conhecido por “pórtico do Tritão”, foi projetado pelo próprio D. Fernando, que o desenhou como um “Pórtico allegórico da creação do mundo”, e parece condensar, em termos simbólicos, a “teoria dos quatro elementos”.
Reforçando esta relação com Tomar, a janela existente no lado oposto deste corpo, copia com alguma liberdade o célebre vai manuelino da autoria de Diogo de Arruda, “achatando-a”. Nicolau Pires foi a Tomar desenhá-la para o príncipe, que reformulou o conjunto.
O conjunto das diversas guaritas, o desnivelamento dos sucessivos terraços, o revestimento parietal com azulejos neo-hispano-árabes, oitocentistas, são elementos significativos. A adaptação da janela do Convento de Cristo, do lado do Pátio dos Arcos e a notável figura do Tritão, simbolizando, segundo alguns autores, a alegoria da Criação do Mundo, são pormenores fundamentais na interpretação deste Palácio.
A planta do edifício é bastante irregular e está condicionada por uma construção ali preexistente – a Capela de Nossa Senhora da Pena – e ainda pela topografia. O resultado é um núcleo sensivelmente quadrangular, organizado à volta de claustro e um outro alongado.
No século XVIII a queda de um raio destruiu parte da torre, capela e sacristia, danos que foram agravados em decorrência do terramoto de 1755, que deixou o convento em ruínas. Apenas a zona do altar-mor, na capela, com um magnífico retábulo em mármore e alabastro atribuído a Nicolau de Chanterenne, permaneceu intacta.
As Fachadas do Palácio da Pena
As fachadas são divididas por bocéis ou torçais e fenestradas, mais ou menos regularmente, e por vãos quadrangulares, rectangulares e de arco pleno. As torres e os baluartes possuem anéis superiores sobre cachorrada ou arcatura, formando caminhos de ronda, mirantes ou terraços. Já as torres quadradas têm nos cunhais guaritas circulares com coberturas cónicas.
A fachada principal está revestida com azulejos de padrão policromo e dispõe de uma varanda ao nível do terceiro piso. No núcleo quadrangular, destacam-se várias arcadas interrompidas sobre murete. Uma escada em U conduz ao claustro, de dois pisos, com arcada de arcos plenos no primeiro e abatidos no segundo. À volta destes dispõem-se algumas das principais salas.
Na ala norte encontra-se a capela, forrada a azulejos padrão, com a nave separada da capela–mor por teia em pau–santo. O parque possui uma ambiência fria e nórdica, o que se deve às influências dos jardins românticos da Alemanha.
Palácio da Pena – Inspiração
Todas as torres (exceptuando a do Relógio) receberam cúpulas. Os motivos de inspiração foram essencialmente colhidos em fontes mouriscas e mudéjares espanholas e em quase todas as obras manuelinas da Grande Estremadura, entre as quais se encontram:
•A Torre de Belém (justificando as guaritas com cúpulas gomeadas e os renques de ameias), os Jerónimos (os vãos, a ornamentação de cordas entrançadas e frisos), o Convento de Cristo (a “bow window”, a própria expressão quase caricatural) e o Palácio da Vila (os frisos de relevos góticos nas cornijas, e a própria realização orgânica do complexo).
As rosas com cruzes inscritas demonstram a secreta genealogia do príncipe, que devia remontar miticamente à Fraternidade Rosa-cruz do século XVII, da qual o príncipe foi grão-mestre e, ainda mais tarde, à Ordem de Cristo, herdeira dos Templários em Portugal.
A concepção dos interiores deste Palácio para adaptação à residência de verão da família real valorizou os excelentes trabalhos em estuque, pinturas murais em “trompe-l’oeil” e diversos revestimentos em azulejo do século XIX, integrando as inúmeras colecções reais em ambientes onde o gosto pelo bricabraque e pelo coleccionismo são bem evidentes.
Traçando um percurso pelo seu interior, várias são as dependências (26 no total) nuamente decoradas segundo o sabor e o colorido românticos, onde se contemplam quase todos os materiais e estilos decorativos conhecidos, que nos levam a reviver esse tempo passado.
Sendo o Palácio Nacional da Pena o baluarte arquitectónico do Movimento Romãntico em Portugal, ele reabilita em si inúmeras expressões de antigas civilizações, cristalizando em cada elemento da sua decoração formas mítico-mágicas, pormenores vegetalistas e animalistas.
Depois de reerguido o que restou do antigo mosteiro hieronimita, com o seu claustro de dois pisos e com as paredes revestidas a azulejos, que datam desde o século XVI até ao século XIX, uma nova estrutura arquitectónica revivalista foi emergindo.
Revivalista no sentido em que nela encontramos elementos característicos de variadas antigas civilizações. Egípcia (elementos animalistas e vegetalistas, assim como no remate das cimalhas e das colunas torsas, onde assenta o arco do balcão da grande varanda). Árabe (os minaretes, diversos arcos trilobados, elementos decorativos e escrita árabe que surgem dispersos).
Podemos falar ainda em revivalismo na medida em que procurou igualmente, nas diversas épocas da história da civilização ocidental, matéria para a sua concepção; assim, o gosto pelo medievalismo está patente, quer no claustro e no fecho das suas abóbadas (que lembram os medalhões das antigas catedrais góticas), quer ainda no torreão (a “porta-férrea” da entrada), no passeio da ronda e nos diversos tipos de guaritas.
O Renascimento surge reabilitado na utilização de vários e característicos elementos decorativos da época, tais como os bicos das guaritas da “porta-férrea”, os vários cunhais das bolas e a manutenção (e integração) do magnífico retábulo em alabastro e mármore da Capela (século XVI), a abundância de elementos mítico-mágicos, a janela “em negativo”, copiada da janela do Capítulo do Convento de Tomar, bem como todo o cordilhame do neo-manuelino.
É do “Terraço da Rainha” que melhor se pode observar e compreender a disposição deste novo espaço arquitectónico, constituído por uma série de terraços desnivelados, escadas em caracol, diversas guaritas, arcos, passadiços e corredores, que nos dão acesso às inúmeras dependências que se espalham, acidental e assimetricamente, segundo o ideal romântico.
Palácio da Pena – Interiores
Antes de penetrarmos e de percorrermos o interior do Palácio, deveremos salientar que estamos perante uma das raras casas reais portuguesas que ainda hoje mantém intacto todo o seu espólio, mobiliário e adereços originais.
A entrada para o Palácio faz-se por um pátio de pequenos arcos arabizantes, terminados num remate superior de vincado gosto egiptizante.
Passando-se a porta, ornamentada com almofadados pétreos, encontramos logo e de imediato, dois belos vasos de ferro fundido (típicos do século XIX e de nítida influência de Eiffel), representando graciosas cenas mitológicas gregas.
Ao fundo, vêem-se dois lances de escadas que formam um U, destacando-se, entre elas e sobre uma base de madeira, o busto do Rei Artista. Por detrás da peanha, pende do corrimão o “Pavilhão Real” usado por D. Pedro V.
No topo das escadas, deparamos com o claustro quinhentista do Convento de Nossa Senhora da Pena, restaurado integralmente por D. Fernando II e tendo ao centro uma concha pétrea gigante.
Desta, assente e sustentada por quatro tartarugas, emana um feto arbóreo, sugerindo-nos a interpretação romântica da vida vegetal a brotar do mundo marinho.
Copa do Palácio da Pena
A copa, que antecede a casa de jantar da Família Real, é preenchida por um enorme armário de madeira recheado com porcelanas e cristais, donde se destacam as peças Limoges-Haviland recortadas e ostentando a Coroa Real portuguesa.
Daqui temos acesso à sala de jantar instalada no antigo refeitório dos monges hieronimitas. O seu mobiliário, todo ele em estilo nacional, foi propositadamente talhado para aquele espaço, sendo digna de nota a elegante mesa posta para doze pessoas e coberta por um magnífico arrendilhado de Bruxelas.
O centro de mesa, representando uma caravela sustida por Ninfas e Neptunos, consiste numa bela peça de ourivesaria francesa oitocentista. Atribuída a Froment Maurice e Louis Aucoc, que aqui constitui o elemento decorativo mais importante.
A janela do fundo mostra cortinados de renda suíça e, à sua frente, sobre uma coluna, observa-se o lindo arranjo de plumagens em forma de leque. No chão, um soberbo tapete turco preenche grande parte do espaço ocupado pela mesa e cadeiras.
Aposentos Reais
Num dos aposentos do Rei D. Carlos, decorado com elevado requinte, observam-se sete telas inacabadas da sua própria autoria, representando cenas amorosas, onde Ninfas e Faunos se envolvem em apaixonadas correrias. Uma bonita colecção de vidros e canecas pode ser observada ainda, sobre uma das pequenas mesas que preenchem todo este espaço.
No compartimento subsequente (quarto de repouso de D. Carlos), vê-se um mobiliário Império com cama de dossel, onde a madeira e o bronze se interligam harmoniosamente. O conjunto faz-nos recordar um cenário de ópera. Traduzindo a mentalidade oitocentista, repleta de sonhos e fantasias.
Por todo o edifício inscrevem-se numerosas casas de banho, onde o gosto pelo exótico e pelo oriental predomina. Da sua decoração faz sempre parte elegantes divãs, otomanas, banheiras revestidas com madeiras acetinadas, torneiras em forma de pássaros e cisnes estilizados, destacando-se ainda os inúmeros frascos de perfumes orientais que preenchem por completo algumas prateleiras.
O primeiro e segundo quartos das damas apresentam um notável trabalho de estuques dos irmãos Meira, realçando-se, no primeiro, a representação de troncos de árvores com pinhas no tecto e a imitação de madeira nas paredes, dando à dependência um ar bastante sóbrio; o seu mobiliário é nacional com uma cama indo-portuguesa datável do século XVIII, construída em teca.
Destaque-se ainda a romântica mesinha de repouso capitoné, profusamente ornamentada e de tampo recortado, O segundo aposento, pintado em tom de mostarda e igualmente atribuído aos estucadores de Afife, apresenta pequenas grinaldas de rosas junto à sanca, bem como todo o tecto decorado com motivos semelhantes. As cadeiras são oitocentistas. Um quadro, colocado em lugar de destaque, é atribuído a N. Alexomati, datando de 1888.
Rei D. Carlos I e a Rainha D. Amélia
Durante o reinado de Carlos I de Portugal, a Família Real ocupou com frequência o palácio, tornando-se a residência predilecta da Rainha D. Amélia, que se ocupou da decoração dos aposentos íntimos. Aqui foi servido um almoço à comitiva de Eduardo VII do Reino Unido, aquando da sua visita oficial ao país, em 1903.
Após o regicídio, a Rainha D. Amélia retirou-se ainda mais para o Palácio da Pena, rodeada de amigas e dos seus cães de estimação. Aqui recebia amiúde a visita do filho, Manuel II de Portugal, que nele tinha os seus aposentos reservados.
Quando rebentou a revolta de 4 de Outubro, em 1910, D. Amélia aguardou na Pena o evoluir da situação, chegando com a sua comitiva a subir aos terraços para observar sinais dos combates em Lisboa.
No dia seguinte, partiu ao encontro de D. Manuel, em Mafra, voltando na mesma tarde ao Palácio da Pena, onde passou a noite de 4 para 5 de Outubro, a última que passou em Portugal antes da queda da Monarquia. No dia seguinte, conhecido o triunfo da República, partiu de novo para Mafra, ao encontro do filho e da sogra, de onde partiriam todos para o exílio.
Com a implantação da República Portuguesa, o palácio foi convertido em museu, com a designação oficial de Palácio Nacional da Pena. Em 1945, a rainha D. Amélia, de visita a Portugal, voltou ao Palácio da Pena, onde pediu para estar sozinha durante alguns minutos: era o seu palácio predilecto.
O Quarto da Rainha D. Amélia
O belíssimo quarto da Rainha D. Amélia, anteriormente de D. Fernando II inclui um excepcional trabalho de estuque com motivos geométricos, dando-nos a impressão de nos encontrarmos numa sala islâmica.
Os dois fechos de abóbadas representam aqui, respectivamente, as armas reais de D. Maria II e do Rei-Consorte; as de D. Carlos e de D. Amélia. A cama, de bilros e em pau-santo, data do século XVIII e apresenta dossel e cobertura.
De referência, ainda, os castiçais de prata, a espevitadeira, os tapetes turcos, as loiças Companhia das Índias. as porcelanas francesas, os cristais da Boémia, os candeeiros Gagehaut e o fenomenal gomil Arte Nova. O toucador contíguo consiste numa pequenina sala forrada a pau-santo, onde se vêem ainda inúmeros “dessous” e “ternures”, capas, leques e outros adereços.
O quarto de vestir da Rainha encontra-se também completamente decorado ao gosto da época, vendo-se, para além do mobiliário de mogno, um bem torneado bengaleiro circular.
A cama de bilros, onde esta soberana passou a última noite antes de partir a caminho do exílio, está agora vestida com dossel, cortinados e cobertura de tecido de padrão da época bem assim os pendentes das duas janela
Chama-se a atenção para algumas peças únicas em exposição nestes aposentos como Aquário do séc. XVI, época Jiajing, em porcelana da China,Guarda-jóias oferecido a D. Amélia pelos ourives da Casa Real, Leitão & Irmão, pelo conjunto de toilette em cristal e prata do séc. XIX, do uso quotidiano desta soberana entre outras.
O mobiliário chinês com embutidos de madrepérola e o contador de laca da China, com decoração fitomórfica, constituem as peças mais representativas da saleta de costura.
Observam-se aqui, no entanto, outras peças também interessantes, tais como os “Cães de Fó” de porcelana, as jarras lacadas, os marfins oitocentistas e a majestosa aguarela de Kymalugant.
Palácio da Pena – Sala de estar
Já na sala de estar privada da Família Real, o que mais nos prende a atenção é o conjunto de porcelanas Meissen, policromadas, bem como os estuques parietais geometrizantes, a cafeteira setecentista e a soberba escultura feminina de E. Barrias, de características algo próximas da Arte Nova.
Refira-se ainda o contador do século XIX, os cadeirões arabizantes sugerindo minaretes, a fruteira de gradilha alta com duas pegas em Companhia das Índias, os inúmeros retratos de família, o piano de madeira de jacarandá e a Caridade de Columbano, o que fornece a esta sala uma sobrecarregada ambiência vincadamente romântica.
Outra das divisões que merecem ser especialmente referenciadas consiste no escritório de D. Maria Amélia de Orleans, de cuja decoração sobressaem as porcelanas Meissen, as esculturas de bronze, os pratos orientais, a imponente cadeira do século XIX e o magnífico óleo de Cristino.
A Sala Árabe no Palácio da Pena
A denominada “Sala Árabe” é, sem dúvida, uma das mais belas e majestosas dependências da Pena. Integralmente pintada a “trompe-l’oeil” por Paolo Pizzi, a sua arcaria árabe sugere novos planos e novas perspectivas ao aposento, dando-lhe uma dimensão quase irreal.
Aqui abundam, por todo o espaço, as caxemiras, as almofadas, as cadeiras indianas e as consolas de ébano, a par dos pratos Companhia das Índias, das lamparinas de mesquita e do lustre francês atribuído a Meissen.
Da “Sala Verde”, são sobretudo dignas de registo as peças em que foram utilizadas as técnicas do “papier maché”, representando ramos de flores, “chinoiseries”, paisagens, etc… Depois de atravessarmos duas pequenas salas de passagem, chegamos a outro encantador espaço – a “Sala Indiana”.
Aqui, deparamos com uma decoração requintada, levada ao seu máximo expoente. Temos cristais da Boémia, elegantemente misturados com um bonito mobiliário indiano rendilhado.
Para além dos contadores de teca, esta sala apresenta ainda o formoso baixo-relevo de Vítor Bastos, representando a Cólera Morbos e, do outro lado da sala, um aparador e uma mesa em meia-lua, ambos de madeira indiana. Pende do tecto um lustre Arte Nova, multicolor.
Esta dependência é rematada por uma enorme janela tripartida, em forma de “bay-window”, a qual corresponde, no exterior, à famosa “Janela do Tritão”.
O auge da perfeição, a nível do trabalho dos estuques, é no entanto atingido apenas no denominado “Salão Nobre”. Essencialmente composto por motivos geométricos de nítida influência árabe, que se articulam com motivos vegetalistas, a grande sala atinge um equilíbrio impressionante.
Saliente-se o lustre neo-gótico de bronze dourado, as quatro grandes esculturas de turcos em madeira de “andiroba”, os quais sustentam candelabros, os bufetes oitocentistas, o aquário da Fábrica do Rato e a lindíssima floreira estilo Carlos X, que decoram todo o espaço. Refira-se, por último, os vitrais alemães do século XIX, de nítida simbologia maçónica, os quais fornecem ao conjunto um toque medievo.
As restantes salas e aposentos do Palácio da Pena (quartos de D. Manuel II, “Sala de Saxe”, “Sala dos Veados”, etc.), encontram-se decoradas com mobiliários exóticos e são caracterizadas por um gosto romântico, idêntico ao das salas já aqui descritas.
A estes espaços vêm juntar-se as inúmeras construções e recantos do Parque nichos, fontes, cascatas, chalets, pontes, pérgolas, capelas, etc., etc.), que transformam este conjunto num autêntico emblema paradigmático do Romantismo Europeu.
Fruto da inspiração de D.Fernando II, o Parque da Pena é o resultado das tendências intelectuais e artísticas do sec. XIX, época do Romantismo. Com a colaboração do Arquitecto Barão de Eschwege e do Engenheiro Barão Kessler, D. Fernando elaborou o projecto de todo o Parque, que viria a envolver o Palácio da Pena.
Recusando a rigidez formal dos jardins clássicos e considerando o acidentado do terreno, a fertilidade do solo, a singularidade climática da Serra e o carácter dos horizontes, D. Fernando II planeou o parque de modo a este simular uma naturalidade quase perfeita.
Para tal, à semelhança dos devaneios arquitectónicos a que se tinha entregue na concepção do Palácio da Pena, inspirando-se em cenários de óperas e em paisagens longínquas, imaginou para o Parque ambientes diversos, contrastantes, em que a presença do insólito e do exótico fosse marcante.
De forma a materializar essa idéia, integrou nos seus projectos os vestígios deixados pelos frades Jerónimos, como, aliás, fez também no Palácio.
Projectou lagos ligados entre si por cascatas e importou, para as florestas e matas que imaginou, espécies de plantas representativas de vários pontos do mundo – Criptomérias do Japão, Fetos da Nova-Zelândia, Cedros do Líbano, Araucárias do Brasil e Tuias da América do Norte – a par de exemplares portugueses, num total de mais de duas mil espécies.
Disseminou ainda pelo Parque pavilhões construídos nos mais diversos estilos arquitectónicos.
O Palácio e o Parque foram idealizados e concretizados como um todo. Do Palácio, o visitante avista um manto de arvoredo que ocupa mais de 200 hectares e constitui o Parque da Pena. Este tem diversos percursos e passeios, com inúmeras construções de jardins, pontes, grutas, bancos de jardim, pérculas e fontes.
Nele existem pequenas casas onde se alojavam guardas e elementos da criadagem, estufas e viveiros com camélias, rododendros, rosas, de cepas invulgares e raras, e obras de arte como a escultura do guerreiro que se avista do Palácio.
O Parque da Pena
Horta dos Frades ou Jardim da Rainha
O nome deve-se ao facto de ser esta a localização da primitiva horta dos frades que habitavam omosteiro no século XVI. Actualmente toma a designação de Jardim da Rainha, por se supor ter sido mais tarde construído para a rainha D. Amélia.
Picadeiro
O picadeiro serviu para as lições de equitação dos príncipes, para garraiadas e como local onde se guardavam os coches. À sua volta existiam magníficas Sequóias vindas da América do Norte, que o ciclone de 1941 viria a destruir. Felizmente, foram poupadas as Magnólias que nos oferecem um espectáculo magnífico na época de floração.
Alto de Santo António
O seu nome deve-se a uma capela circular que aí existia dedicada a Santo António, pertencente ao antigo mosteiro Jerónimo. No local foi construído, segundo um projecto do pai de D. Fernando II, o Templo das Colunas, miradouro, hoje envolvido pela densa vegetação do parque e de onde se podia desfrutar uma das mais belas vistas sobre o Palácio.
O Guerreiro
No alto do aglomerado de rochedos encontra-se a estátua do Guerreiro localizada no penedo da Tapada do Ferreira, a cerca de 490 metros de altitude. Trata-se de um bronze da autoria de Ernesto Rusconi (1848) que pretenderá representar o Rei D. Fernando II como guardião da sua obra.
Cruz Alta
É o ponto mais alto da serra de Sintra, atingindo os 529 metros de altitude. O seu nome deve-se a uma cruz que lá foi colocada no século XVI, por ordem de D. João III. Esta cruz, em pedra e com uma estrutura interna de ferro foi atingida várias vezes por relâmpagos, acabando por ser destruída.
Alto de Santa Catarina
Este seria o miradouro preferido da rainha D. Amélia, mulher do rei D. Carlos I. Por esse motivo, o banco que aqui se encontra talhado na rocha granítica é chamado o “Trono da Rainha”. Daqui é possível avistar o Palácio e a copa das árvores. As espécies que enquadram este miradouro são, na sua maioria, carvalhos (Carvalho-negral), parte importante da floresta primitiva da serra.
Gruta do Monge
Ainda no tempo do mosteiro, este foi um dos locais utilizados pelos frades Jerónimos como local de meditação e recolhimento.
Feteira da Rainha
A este vale terá sido dado o nome de Feteira da Rainha em homenagem à rainha D. Amélia. A feteira é constituída por uma colecção de Fetos, alguns originários da Austrália e da Nova Zelândia, a que se juntaram Castanheiros autóctones, Faias e Carvalhos que coexistem com os Rododendros asiáticos,Camélias e Bordos do Japão, bem como uma Túia-gigante, oriunda da América do Norte.
Fonte dos Passarinhos
Pavilhão erigido em 1853, inspirado na cultura árabe. De base octogonal, encimado por uma cúpula esférica, apresenta uma inscrição em árabe, na qual se alude à grandiosidade da obra de D. Fernando,comparando-a à de D. Manuel I. Os azulejos e diversos elementos decorativos neo-mouriscos,pontuam o parque de elementos exóticos e orientalizantes, próprios da gramática decorativa do Romantismo.
Tanque dos Frades
Localizado no topo do Jardim das Camélias, é um dos raros vestígios do tempo dos frades. O Jardim das Camélias, que oferece um espectáculo de formas, de cor e de texturas na época de floração, consiste numa extraordinária colecção de diferentes variedades desta espécie e é, também, um dos poucos jardins formais de todo o Parque
Vale dos Lagos
Aproveitando as linhas de água de todo o Parque que confluem para este vale, criaram-se aqui cinco lagos, rodeados por fetos arbóreos e árvores de grande porte. Destaca-se o Lago de São Martinho com uma pateira em forma de torre medieval, e o Lago do Pesqueiro, onde se conta que o rei D. Carlos pescava carpas.
Lagos no Paque da Pena
Convento de Nossa Senhora da Pena
Do mosteiro quinhentista, integrado no Palácio Nacional da Pena, restam apenas a pequena igreja e respectivos anexos, bem como o claustro e o refeitório.
A igreja é de planta em ângulo recto, ou cotovelo, e encontra-se inteiramente revestida de azulejos, verdes e brancos na nave, e policromos tanto na capela-mor como no coro, o qual se prolonga para o lado da Epístola. Esses ricos azulejos de tapete seiscentistas devem-se a Filipe II, que mandou reparar as paredes da capela em 1619.
No corpo da igreja inscrevem-se dois altares, hoje vazios, mas que foram destinados às imagens de Nossa Senhora da Pena e de São Jerónimo.
Sob a abóbada mestra ergue-se, no altar-mor, um magnífico retábulo em alabastro e mármore negro da autoria de Nicolau de Chanterene, datado de 1532. Todo o retábulo é repartido por colunas e pilastras, encimado pela representação da Sagrada Família em coroamento,
As restantes superfícies encerram, entre finas edículas, uma profusão de altos relevos e estatuetas representando episódios da História Sagrada.
Do coro passa-se à arcaria do claustro, curioso espécime gótico-manuelino, rude e forte, cujas paredes se encontram revestidas de azulejos mudéjares do século XVI.
Este claustro conduz-nos, através de um portal mainelado, ao que teriam sido os restantes compartimentos do edifício quinhentista, entretanto desaparecidos e substituídos pela construção “romântica” de D. Fernando II.
A origem do Convento de Nossa Senhora da Pena, implantado num dos cumes mais elevados da Serra de Sintra, perde-se na noite dos tempos.
Consta que no local se registou uma aparição da Virgem, tendo-se aí edificado então uma pequenina ermida dedicada a Nossa Senhora da Pena, na qual, por ordem de D. João I, os priores da Igreja de Santa Maria de Sintra celebravam missa todos os sábados.
A devoção régia a este orago encontra-se bem documentada. Em 1493, veio D. João II a esta ermida, com D. Leonor, sua mulher, pagar um voto à Senhora da Pena; mas foi D. Manuel I quem lhe dedicou especial afeição.
Por sua ordem, no ano de 1503, efectuaram-se terraplanagens e edificou-se, em acrescento da ermidinha, um convento de madeira destinado à ordem de São Jerónimo
No entanto, em 1511, vendo o monarca que a construção era perecível, optou antes por fazê-la de cantaria e abóbada transformando o convento numa casa religiosa sólida para 18 monges, que incluía capela, sacristia, claustro, dormitório, oficinas e campanário, segundo projecto do italiano João Potassi.
D. João III e D. Catarina expressaram também a sua devoção à imagem de Nossa Senhora da Pena, mandando esculpir, no ano de 1532, um magnífico retábulo de jaspe e alabastro para o altar-mor da capela, em cumprimento de promessa pelo nascimento do seu filho, o príncipe D. Manuel.
In “Sintra Património da Humanidade”
Pode consultar aqui mais fotografias antigas do Palácio da Pena e do Mosteiro de Nossa Senhora da Pena.