O Castelo dos Mouros em Sintra está erguido sobre um maciço rochoso, isolado num dos cumes da serra de Sintra, na Estremadura, do alto das suas muralhas descortina-se uma vista privilegiada de toda a sua envolvência rural que se estende até ao oceano Atlântico.
Sobre esta toponímia, o historiador Pinho Leal referiu:
“A origem do nome veio de um templo erguido uns 308 anos antes de Cristo, por Gregos, Galo-celtas e Túrdulos, dedicado à Lua. Os Celtas chamavam a Lua de ‘Cynthia’ e quando os Árabes dominaram a região, por não pronunciar o ‘s’, chamavam o local de ‘Chintra’ ou ‘Zintira’.
A pesquisa arqueológica contemporânea, entretanto, revela que a primitiva ocupação da região de Sintra data dos séculos X a VIII a.C. Quando da Invasão muçulmana da Península Ibérica, a partir do século VIII a região foi ocupada, tendo a sua povoação recebido o nome de “as-Shantara”.
Os estudiosos são acordes em afirmar que foram eles os responsáveis pela primitiva fortificação da penedia, entre o século VIII e o IX, com a finalidade de controlar estrategicamente as vias terrestres que ligavam Sintra a Mafra, Cascais e Lisboa.
Integrante dos domínios da taifa de Badajoz, no alvorecer do século XII, diante da ameaça representada pelas forças de Ali ibn Yusuf ibn Tashfin, que oriundas do Norte de África, haviam passado à península visando a conquista e reunificação dos domínios Almorávidas, o governante de Badajoz, Mutawaquil, entregou Sintra, juntamente com Santarém e Lisboa, na Primavera de 1093, ao rei Afonso VI de Leão e Castela, visando uma aliança defensiva, que não se sustentou.
Envolvido com a defesa dos seus próprios territórios, o soberano cristão não foi capaz de assistir o governante mouro, cujos territórios vieram a cair, no ano seguinte (1094), diante dos invasores. Desse modo, Lisboa, Santarém e Sintra voltaram ao domínio muçulmano, agora sob os Almorávidas.
O destino de Sintra manteve-se associado ao de Lisboa, que viria a ser reconquistada pelas forças de Afonso VI de Leão, para voltar ao domínio muçulmano em 1095, até se entregar definitivamente, a D. Afonso Henriques (1112-1185) em 1147.
Vitor Manuel Adrião historiador de Sintra conta que:
Corria o ano 1147. O alcácer fortificado de Xentra acabara de ser ocupado pelas forças sitiantes de Ibne Arrique. Não se dera terçar sangrento. As espadas e as cimitarras não haviam deixado o repouso das bainhas. Os alaúdes e as cítaras não haviam parado para repousar; os risos, os cantos e as danças descuidaram a interrupção… Houvera acordo: Cristãos e Mouros poderiam coabitar na maior paz e concórdia nesta Meca ocidental, nesta Tulan de antigos e coevos onde o sangue de homem jamais deveria profanar a Terra de Deus.
«Paraíso Terreal»! – Al-Shantara, Xintara, Xentra, Cyntia, Cintria, Cintra, Sintra.
Assim foi, assim se deu. Ficando firmados no alcácer os acordos de respeito e boa convivência mútuas, os Cavaleiros do manto branco em que se lavrava a Cruz vermelha de Cristo, fizeram-se ao castelo no cimo do Monte dos Penedos, altaneiro e misterioso.
D. Afonso Henriques
Ibne Arrique, ou seja, Afonso Henriques, ia na dianteira. Ele sabia o que os esperava… Dera tempo para a retirada segura dos discretos eremitas e santões Muridj dessa Rábita do Ocidente, dessa Torre da Fé islâmica onde os mais sábios e perfeitos, morabitos reclusos voluntários na Serra da Lua, viviam apartados dos de baixo, dos da almedina vilareja, e tendo a protegê-los externamente uma guarda pouco mais que simbólica de 30 guerreiros, os Refik.
Ante o pasmo não de todos mas da maioria dos Templários, o castelo estava vazio, a mesquita de Fátima, ao lado, despojada das suas relíquias sagradas… não se via vivalma.
A vida humana havia desaparecido como por encantamento, como que tragada nas entranhas cavernosas desta Serra teimando, contrariando todos os acidentes próprios à vulgar natureza do ser homem, em manter a condição milenar de Sagrada, essa mesma advinda dos alvores do Género Humano.
O olhar mais atento de alguém, talvez o Grão-Mestre Gualdim Pais, acaba divisando, por entre as brumas da serrania e à porta da fortaleza, um vulto humano. Era um velho, um ancião de Xentra que recebe Ibne Arrique com um sorriso repleto de enigma, e logo após lhe entregar a Chave da Rábita retira-se subindo por ponto adarve, assim também esse velho desaparecendo nas entranhas do mistério… o último Muridj ou Mouro de Xentra.
Foi assim que alguns dizem que Sintra foi «conquistada» aos Mouros, na narrativa das crónicas e lendas antigas, não com estas palavras textuais mas com as de cada autor e todos de acordo quanto à descrição do acontecido.
Como puderam desaparecer tão misteriosamente os mouros do castelo? Por onde desapareceram? Para onde foram?
Certo é que havia «boca de fuga», e esta estaria junto à torre albarrã, numa tulha escondendo um túnel ligando o castelo a Rio de Mouro que então ainda não existia como povoação, tão-só uns míseros e dispersos casebres na paisagem plana, então enfeitada com o arraial de D. Afonso Henriques – seriam 6 a 8 quilómetros em linha recta, de caminho subterrâneo. Será isto verdade?
As Grutas do Castelo dos Mouros
A verdade é que o Rio de Mouro (antes, de Mouros) existe e o túnel ou gruta também, precisamente em Colaride, no limite Este do Cacém e que antanho pertencia à freguesia do Algueirão – Rio de Mouro. Ainda hoje corre aí a Ribeira das Jardas que separa as duas freguesias, sendo curioso que a palavra árabe cacéme (donde cacém) significa precisamente “a divisão”.
Esta gruta de Colaride é também donominada “Gruta dos Mouros”, “Fojo dos Mouros”, “Algar”, etc. Possui quatro poços sendo o maior de 12 metros de profundidade, dois com uma profundidade de 7 metros e um último com 4 metros. No fim do primeiro poço existe um sifão temporário.
Sendo uma gruta própria para especialistas em espeleologia, é altamente irrecomendável a visita a ela por curiosos incautos devidos aos perigos que a sua estrutura acidentada apresenta, já aí tendo ocorrido alguns acidentes graves.
No seu interior, correm duas ribeiras subterrâneas e há uma cascata de 15 metros de altura e um lago, havendo alguns corredores e galerias de grandes dimensões que já foram designados com nomes como “Sala das Lamas” ou “Sala do Túmulo” (este último epíteto é bastante significativo, por um facto mantido secreto mas que descreverei mais adiante).
É desta gruta pré-histórica ligando o cimo da Serra de Sintra à planura mais adiante que a cerca, que o Algueirão herda o seu nome, pois o nome árabe Al-Gueirum, plural de “Algar”, significa exactamente “Caverna”. Mais adiante desta localidade, levanta-se a Serra das Minas!…
O Visconde de Juromenha, na página 134 da sua Cintra Pinturesca, Lisboa, 1838, após pegar na tradição oral correndo na terra, escreveu sobre o assunto indicando a passagem subterrânea no Castelo dos Mouros:
«Indo para a primeira torre se encontrava uma tulha que tinha cinco palmos e meio de diâmetro, por onde dizem que havia uma estrada encoberta que ia até Rio de Mouro, e que dela se denominara o dito Rio, e para a parte direita se divisava o sinal de uma porta por onde dizem era a dita entrada.»
Conhecedor dessa tradição mais oral que escrita e decerto suspeitando não haver fumaça sem fogo, em 1970-72 o espeleólogo Augusto Morgado investigou e descobriu a dita passagem subterrânea do castelo, notícia que publicou no jornal Época, 12 de Agosto de 1972.
Ao mesmo tempo, é descrita a passagem subterrânea que liga o espaço actual da cave do Café Paris ao Palácio da Vila e que sobe subterraneamente até ao Castelo, facto já conhecido dos Templários que estiveram acantonados no lugar das Murtas e foram os primeiros a restaurar esse primitivo Palácio árabe, dando-lhe feição ocidental, românica originalmente (século XII), e depois gótica já pela mão da Ordem de Cristo (século XIV).
Exemplo de hipógeo com fim ritualístico será também o conjunto de galerias subterrâneas ocultadas nas traseiras do edifício oitocentista do Café da Avozinha defronte para o Palácio, antigo Paço Real.
A verdade é que debaixo do Castelo dos Mouros existe uma imensa gruta natural que é das mais belas da Serra, entrando-se por baixo (está vedada por uma porta de ferro) junto ao caminho que leva à entrada principal no mesmo. Junto a ela passam diariamente inúmeros visitantes, por certo completamente alheios da maravilha natural que aí se esconde.
As Lendas do Castelo
Há ainda a lenda da “Moura dos Sete Ais” (Seteais) que deu sete supiros pelo cavaleiro cristão, talvez Templário, D. Mendo de Paiva, quando este a viu com outros mouros escaparem-se por uma porta secreta no Castelo e a fez cativa…
Trata-se de uma “lenda de amor” inserta no imobiliário das lendas de “Mouras encantadas”, tal qual aquela outra versão da moura Zaida, filha do alcaide do castelo, dada de amores por um cavaleiro cristão mas que desapareceu nas entranhas da Terra por uma passagem secreta que a lenda diz haver aí, no próprio castelo, na parte que hoje dá para o fronteiro Palácio da Pena ou da Penha.
Outra referência não menos misteriosa do Castelo dos Mouros, está na lenda que sob a sua cisterna se encontra enterrado e encerrado, num sarcófago de bronze e prata, um Rei Mouro, até hoje protegido por uma horda implacável de demónios ou djins, tão caros à tradição religiosa islâmica!… Essa lenda tão antiga ficou perpetuada, desde o século XVI, num poema de Gil Vicente, o seu Triunfo do Inverno:
(A Serra de Sintra que fala):
Eu tenho muitos tesouros
Que lhe puderam ser dados
Mas ficaram encantados
Deles de tempos de Mouros
Deles dos antepassados
Um filho dos Reis passados
Dos gentios Portugueses
Tenho eu muito guardado
Há mil anos e três meses
Por um mágico encantado
E este tem um jardim
Do paraíso terreal
Que Salomão mandou aqui
A um Rei de Portugal
E tem-no seu filho ali.
Na revista O Domingo Illustrado, 2.º volume, n.º 57, Fevereiro – 1898, Lisboa, encontro a seguinte e significativa notícia do que existiu junto a uma aldeia colada à de Pombal de Ansiães, onde se formou a ORDEM DE MARIZ nesta 5.ª Raça-Mãe Ariana:
«Seixo de Ansiães – próximo a esta aldeia, e acima da capela de Nossa Senhora a Velha, existem três covas: uma com 25 palmos d’altura e duas com 30, tão largas, que no fundo de cada uma d’elas estão plantadas muitas oliveiras (emblemáticas do Espírito de PAX).
«Dentro de uma concavidade, quase entupida, que está por baixo destas covas e pegada a elas, existem, segundo dizem pessoas que nela entraram, várias salas, das quais, por uma galeria subterrânea, se vai ter ao rio Douro (antes, rio Tua), que fica a 3 quilómetros de distância.»
Trata-se de uma rede de canais subterrâneos que, comunicando uns com os outros, vai adentrando cada vez mais fundo o seio da Terra…
Tal qual ocorria na Penha Longa de Sintra, junto à Lagoa Azul, onde um espaço subterrâneo dava acesso a outro e cada vez mais fundo… até à estonteante agonia da profanidade.
É novamente o Visconde de Juromenha quem dá notícia disso:
«A pouca distância deste Mosteiro (dos Jerónimos da Penha Longa) está uma gruta de cristalização que antigamente foi fechada, e que foi descoberta segundo me afirmou (por constar de memórias antigas) por um Monge deste Convento no reinado d’El-Rei D. João 3.º.
Desce-se para esta gruta por uma porta (que noutro tempo serviu para a guardar) que está a sete ou oito pés de altura, com ajuda de uma escada de mão: logo em baixo há um pequeno largo, donde segue uma mina pela terra dentro, pela qual é necessário, em parte ir de rastos e vai terminar em outro pequeno vão.
Pela porta superior há uma fenda por onde o sol, penetrando os seus raios com um efeito maravilhoso, torna fulgente esta casa cristalina. As águas que lhe entram julgo terem formado para o lado esquerdo, onde parte um ramo da gruta, e onde parece mais escavada algum depósito, porque os vizinhos têm por costume avisarem aos curiosos de evitarem um poço, que asseveram existir naquela mina.»
Palácio da Pena e Castelo dos Mouros
A Geografia de Cazuíni, transcrevendo a de Al-Údri, dá a mesma notícia e adianta:
«Nos arredores de Lisboa existe uma montanha na qual se encontram pedras barâd (fosforescentes). Estas pedras brilham de noite, como lâmpadas. Informou quem já foi ao cimo desta montanha que estas pedras, com efeito, iluminam como se fossem lanternas. Esta montanha é uma mina de ónix.»
Informação igual é dada por Qazwini, dizendo que em Xentra- “há pedras em forma de bolota e de granito, assim como outras que à noite brilham como lanternas ou archotes e são de ónix. Acrescenta que na Montanha de Sintra há muitas pedras medicinais com as quais se preparam solutos bons para os rins, além de que na costa próxima colhe-se um âmbar de primeira qualidade, semelhante ao melhor do mundo, o “xajarî” da Índia.“
Independentemente da riqueza mineralógica do seio fecundo de Sintra, os textos parecem sugerir por igual uma relação velada com a Alquimia, em que o Saber Arábigo foi mestre, tanto por o ónix ser considerado por persas e hindus como protector contra as más vibrações psicomentais e acelerador do parto ou separação do denso em subtil, como também, pela definição de Dionísio Zacarias (1510-1556).
Muito mais tarde, reinando D. João V, o naturalista francês Merveilleux afirmou, no relatório que lhe encomendou o monarca, ter visitado o mundo subterrâneo sintrense e lá encontrado pedras preciosas, indo assim confirmar as assertivas dos antigos geógrafos árabes.
O místico e o sobrenatural da Serra de Sintra
Com efeito, o mais importante relato do ambiente místico e sobrenatural da Serra de Sintra no século XVIII, pode ser encontrado nas Memórias Instrutivas de Portugal (1723-1726) – in O Portugal de D. João V visto por três forasteiros onde o botânico suíço Charles Fréderic de Merveilleux, além de outras zonas do País, especialmente Lisboa, descreve o respeito e temor gerais que se tinha de Sintra e o seu Mundo Subterrâneo.
Com o característico cepticismo do douto racional que iluminou o seu tempo, recambiando e reduzindo tudo quanto viu, ouviu e desapercebeu a «superstições dum povo inculto», Merveilleux nem sonhava que iria prestar um grande préstimo quando escreveu:
«Desde o Castelo de Sintra às superstições dos portugueses, passando pelos Subterrâneos de Sintra ou pelo Convento dos Capuchos, e pela senhora Pedagache, que dizia-se que era capaz de ver através de volumes físicos.
«Deu-me também [D. Diogo de Mendonça] um salvo-conduto para visitar a Serra de Sintra e o seu castelo, onde seria arriscado ir sem tal garantia, como, aliás, a todo o restante reino. E isto porque os portugueses estão convencidos que o seu país está cheio de tesouros ocultos e que os estrangeiros têm artes de lhos descobrir.
«Enquanto estive na Serra de Sintra, cheguei à conclusão que esta serra era constituída de uma maneira muito particular e a tal ponto que julgo não haver outra assim em todo o mundo. A serra termina num promontório que, à distância de duas léguas, serve de guia aos navegantes.
«A ridícula superstição dos portugueses de haver tesouros ocultos e espíritos de guarda a eles tem impedido que se façam escavações nestes lugares. Quando se lhes fala em tal fingem não ter medo nenhum, mas assim que se convida algum habitante de Sintra a entrar só nalgum subterrâneo, nem o mais ousado se atreve, mesmo que em paga lhe oferecessem o reino de Portugal.
Suponho, porém, que o conde de Assumar, vice-rei das Minas, e o marquês de Alegrete iriam lá se pudessem fazê-lo sem escândalo. Porque neste país tudo é mistério, feitiçaria, sortilégio ou magia.»
Tudo isso rematado nos dias actuais pela confirmação dada no Instituto Nacional de Meteorologia por Helena Abreu, especialista em magnetismo: «Sintra é um antigo vulcão e por isso é natural que seja um grande maciço magnético».
Com efeito, no mapa geomagnético da Península Ibérica, elaborado em 1962 pelo Serviço Meteorológico de Portugal, esta Serra está identificada como uma das três zonas de maior magnetismo – as chamadas anomalias do campo magnético da Terra – baseadas na natureza dos minérios.
Voltando agora para falar do destino de Sintra como dissemos em cima, manteve-se associado ao de Lisboa, que viria a ser reconquistada pelas forças de Afonso VI de Leão, para voltar ao domínio muçulmano em 1095, até se entregar definitivamente, a D. Afonso Henriques (1112-1185) em 1147.
Visando o seu repovoamento e defesa, o soberano outorgou Carta de Foral a Sintra em 1154, quando terá determinado reparos nas suas defesas, dotando-a de um templo, a Igreja de São Pedro de Canaferrim.
O seu filho e sucessor, D. Sancho I (1185-1211) também dispensou cuidados ao castelo, remodelando e reforçando-lhe as defesas. Assim também procedeu, séculos mais tarde, D. Fernando I (1367-1383), tendo o castelo sido assediado por tropas de Castela no contexto das chamadas Guerras fernandinas.
À época da crise de 1383-1385, era seu Alcaide-mor D. Henrique Manuel de Vilhena, que tomou o partido por D. Beatriz, somente entregando este castelo “forte e muito alto e fragoso” que lhe fora confiado após a vitória de João I de Portugal na batalha de Aljubarrota (LOPES, Fernão. Crónica de D. João I).
Posteriormente, diversos soberanos portugueses elegeram Sintra para sua estadia, demorando-se no “Paço Régio”, construído para esse fim e sucessivamente ampliado e melhorado ao longo dos séculos (Palácio Nacional de Sintra), tendo a povoação se desenvolvido em torno deste novo núcleo.
O castelo manteve-se, por essa razão em segundo plano, entrando em decadência, principalmente após o século XV, face à expulsão dos judeus do país, então os seus únicos habitantes. No século XVI encontrava-se desabitado. A queda de um raio causou-lhe danos à Torre de Menagem (1636), danos grandemente aumentados pelo terramoto de 1755.
No século XIX, sob o segundo reinado de D. Maria II (1834-1853), o seu consorte, Fernando II, sob o impulso de redescoberta da Idade Média proporcionado pelo Romantismo, tomou, em 1839, o antigo castelo por aforamento à Câmara Municipal de Sintra pela quantia anual de 210 Réis, promovendo-lhe amplas obras de reconstrução que, embora de caráter amador, tiveram o mérito de sustar o avançado estado de degradação em que a estrutura se encontrava.
Ao gosto imaginativo da época foram adicionados locais de contemplação, caminhos de acesso e vegetação abundante, transformando-o numa atração turística.
Castelo dos Mouros Características.
O Castelo dos Mouros e a cisterna encontram-se classificados como Monumento Nacional por Decreto publicado em 23 de Junho de 1910. A intervenção do poder público português no monumento iniciou-se em 1939, com a reconstrução de troços das muralhas. Após intervenções menores (1954, 1965), em 1986 procederam-se trabalhos de limpeza e reconstrução de alvenarias, degraus e ameias em várias zonas do castelo, repetindo-se os trabalhos de limpeza das muralhas em nova campanha, em 1992.
As suas muralhas são constituídas por uma cintura dupla, exterior e interior. A Leste ainda são visíveis troços da muralha exterior, onde se localiza a porta em rodízio de acesso ao recinto. O topo da muralha interna, ameada, é percorrido por adarve, sendo reforçada por diversas torres
As muralhas foram executadas segundo a técnica da soga e tissão que se pode ainda observar no seu lanço melhor conservado. Faixas silhares com aproximadamente 30–40 cm de altura, estão colocadas alternadamente em largura e comprimento.
Estas são intervaladas por curtas e estreitas faixas de pedras inseridas em argamassa. Esta técnica altera-se acima dos 4–5 m de altura, onde se passa a registar uma menor qualidade, fruto de uma segunda fase de construção. Num outro trecho das muralhas é visível a área de união entre as diferentes técnicas utilizadas, herança das diferentes fases de intervenção.
Além das muralhas ameadas, torres e adarves, o conjunto é completado por diversas rampas e escadarias de acesso.
Um outro elemento digno de nota é a porta árabe em arco em ferradura.
A muralha apresenta cinco torres: quatro de planta rectangular e uma de planta circular encimadas por merlões piramidais, já sem vestígio dos dois pisos e do sistema de cobertura primitivos.
A torre na cota mais elevada do terreno, conhecida também por Torre Real, é acedida através de uma escadaria de 500 degraus. No período islâmico constituíu-se na alcáçova. No período cristão consta que lá terá vivido Bernardim Ribeiro, escritor português do século XVI.
Um segundo pano de muralha, incompleto porque tem no desenvolvimento do maciço rochoso para NO e N fortíssimo e quase intransponível complemento natural – desenvolve-se à distância média de 80m do primeiro, em arco de círculo que vai pelo Sul de Poente a Nascente.
Já assim o domínio fica bastante alargado porem os limites considerados do Castelo e sua tapada vão ainda bastante mais longe principalmente para norte sobre o maciço rochoso e para leste no seu contacto com as propriedades da Abelheira e S. Miguel ambas do estado e depois para Sueste e Sul em porção mais estreita designada Encosta do Castelo que vem a contactar com a Tapada do Inhaca e no extremo nascente delimitada pela velhíssima Quinta da Trindade.
À parte as porções Norte e Poente de rocha viva ou simples matagal há grande interesse botânico -florestal e foi trabalhada muito cedo e por partes com grande esmero, com a mesma intenção e visão superiores com que se trabalhou o Parque da Pena pelo Monarca D. Fernando II.
Com a obrigação de manter as entradas públicas de forma a em nenhum tempo poder ser negada a entrada ou saída de tão lindo passeio as obrigações do Monarca foram cuidadosamente respeitadas pelo que se refere a construções e ao restauro que pode bem servir de exemplo.
Os resíduos da pequena igreja românica mantêm-se intactos e mandou D. Fernando que se juntassem num pequeno túmulo encimado pela cruz e pelo crescente as ossadas que ao remexer entulhos se foram encontrados.
Pelo que se refere á plantação de árvores e arbustos e ao embelezamento dos locais com vegetação adequada há toda a razão para supor que as primeiras implantações são coevas das mais antigas da Pena e que houve um acentuado paralelismo na ordenação das tarefas de cá e lá. Dai que vamos encontrar grandes e belos exemplares.
Acresce que mais resguardada esta área sobretudo na vertente N e NE e em certos sítios recônditos, o devastador ciclone de 15 de Fevereiro de 1941 não produziu aqui tão devastadores efeitos, tendo sido poupado material diverso nesse dia de triste memória para o Parque da Pena e toda a Serra de Sintra.
No interior do castelo, próximo ao Portão de Armas, ergue-se uma igreja devotada a São Pedro, a Igreja de São Pedro de Canaferrim. Remonta ao século XII, erguida após a conquista do castelo por D. Afonso Henriques, tendo se constituído na primeira igreja paroquial de Sintra.
Em estilo românico, de pequenas dimensões, apresenta planta longitudinal e nave única, sem cobertura. A capela-mor com abóbada de berço é de planta rectangular e apresenta vestígios de frescos. A igreja tem dois portais, um de arco pleno de dupla volta assente em colunelos de capitéis decorados e outro com arco duplo apoiado em colunas semelhantes às referidas anteriormente com capitéis com motivos fitomórficos.
A sua prospecção arqueológica revelou a presença de diversos túmulos, pertencentes a uma antiga necrópole medieval.
Escavada em 1981, a antiga igreja de São Pedro de Canaferrim revelou, à sua volta, a existência de um nível de enterramentos medievais. Apesar da inexistência de espólio numismático que permita datar, com precisão, a necrópole, a sua tipologia – bem como os dados históricos relativos à igreja (construída nos finais do século XII e já abandonada no século XV) – apontam para uma época arcaica.
Assim, as sepulturas até agora escavadas poderão eventualmente remontar aos finais do século XII – inícios do XIII. Na região os principais paralelos para este tipo de sepulturas medievais encontram-se na próxima necrópole medieval da Igreja Matriz de Santa Maria, bem como na necrópole rural de São Miguel de Odrinhas.
Contígua à Igreja de São Pedro de Canaferrim, destaca-se uma cisterna de grande capacidade, que remonta ao período islâmico. Com as dimensões de 18 metros de comprimento por 6 de largura e 9 de altura, em seu interior abobadado brota a nascente que abastecia o Palácio Nacional de Sintra. O seu reservatório foi reconstruído após o grande terramoto de 1755. É percebida pelo visitante através de duas grandes aberturas cónicas de ventilação.
Acede-se ao monumento, visível já da vila de Sintra, subindo a Rampa da Pena, um caminho sinuoso que corre pelo interior da serra. Este espaço foi sendo, ao longo dos séculos, não só ocupado por obras de valor artístico e histórico como também pelos mais variados espécimes botânicos, muitos deles de carácter raro e exótico.
Ferreira de Castro
Falecido em 29 de Junho de 1974, Ferreira de Castro repousa no Castelo dos Mouros na Serra de Sintra, sob um banco talhado na rocha, numa vereda que pelo caminho que fica perto da Igreja D. Maria passando a porta giratória conduz ao Castelo dos Mouros.
Tendo escrito aqui parte da sua obra, hospedando-se em especial no antigo Hotel Netto, o escritor sentia-se particularmente bem neste cenário verdejante, tanto mais que a Natureza vegetal é um tópico importante nos seus livros, no seu estilo literário e dir-se-ia que indissociável da sua própria essência de homem e artista.
Ficar para toda a eternidade integrado de corpo e alma na Natureza que lhe inspirara tantas páginas, era uma ideia que acalentara desde cedo. Assim, em 1970, fez o único pedido às autoridades do seu país, e eu em homenagem a este grande apaixonado de Sintra, deixo em baixo raras fotografias da sua última morada e o seu último pedido:
“Desejaria ficar sepultado à beira de uma dessas poéticas veredas
que dão acesso ao Castelo dos Mouros sob as velhas árvores românticas
que ali residem e tantas vezes contemplei com esta ideia no meu espírito.
Ficar perto dos homens, meus irmãos, e mais próximo da Lua
e das estrelas, minhas amigas, tendo em frente a terra verde
e o mar a perder de vista – o mar e a terra que tanto amei.”
Actualmente o Castelo dos Mouros na Serra de Sintra faz parte integrante do Património Mundial da Unesco de Sintra. É visitado por milhares de turistas que ano após ano vêm visitar esta maravilha de Portugal.