Assalto às finanças de Sintra em 1980

Assalto às finanças de Sintra em 1980

O assalto às finanças de Sintra, segunda-feira 25 de fevereiro de 1980. Um polícia morto e dois feridos em novo assalto à repartição de finanças de Sintra era notícia dos jornais.

Este assalto foi depois atribuído por muitos à organização das Forças Populares 25 de Abril, esse assunto descrevemos no final deste artigo. Agora transcrevemos como tudo aconteceu.

Faltavam quase 10 minutos para o meio-dia quando 4 indivíduos armados entram na Repartição de Finanças de Sintra, usam luvas, impunham armas de guerra e colocam gorros de lã na cabeça.

Num ápice, dois deles neutralizaram os funcionários e abrindo cofres e gavetas foram retirando todo o dinheiro e valores que iam encontrando. 

Um polícia de trânsito de serviço alertado, dirigiu-se para o local e sustentou uma troca de tiros com os assaltantes. É baleado no estômago e posteriormente na cabeça e nas costas, vindo a morrer pouco depois.

Um guarda da GNR que se encontrava ocasionalmente na repartição assiste aos últimos momentos do polícia morto.

“O polícia ainda começou a olhar para mim, queria falar comigo, mas começou  a deitar muito sangue pela boca e já não falou comigo. Eu pus-lhe a mão em cima da barriga, nem respirava, era para fazer a respiração boca a boca. Não pude fazer nada. Ele olhou para mim, deixou cair a cabeça para o lado e os braços e eu vi que o polícia já estava morto” 

No assalto às finanças de Sintra na retirada os assaltantes pontapeiam uma senhora e disparam mais 6 tiros, um dos quais vem atingir de raspão Manuel Caixeiro de 80 anos. Neste último caso a bala rasgou a camisola e a camisa deste homem que apenas tinha lá dirigido para receber a sua pensão.

A Senhora ferida era empregada das finanças tendo sido depois transportada para o Hospital de Sintra onde recebeu assistência.

É a terceira vez que esta repartição é assaltada. Da primeira vez de noite foram 4000 contos, na segunda de novo de noite e pelo tecto voaram mais 5000 contos.

Com este golpe à luz do dia, e com armas, eleva-se a quase 15 000 contos o montante dos roubos praticados nesta simples repartição. Inesperadamente, estes locais com tão elevados valores não dispõe de qualquer sistema de alarme ou um simples telefone que seja.

Embora sejam por enquanto desconhecidas as circunstâncias em que se deu o assalto, assim corno o montante do roubo, testemunhas locais identificaram os assaltantes como “dois rapazes novos armados de metralhadora“.

O policia morto era natural de Ribeira de Sintra e o seu nome era Delfim de Almeida Fernandes. Tem uma rua na sua memória na Ribeira junto do Largo do Poço. Está sepultado no cemitério de S. Marçal

Um testemunho do assalto às finanças de Sintra

Testemunho de Carlos Cabriz e de outras testemunhas sobre o assalto às finanças de Sintra.

Eu vi, portanto, três quando eles entraram eram 3 e depois quando passam pela janela já na fuga, vejo o quarto. O autor para mim, é um tipo de estrutura baixíssima, mais baixo que eu, forte baixo, e então um deles que vem aqui aos selos era alto, extremamente alto e os outros dois já não tenho assim e pormenores para contar a estrutura deles. 

Entretanto, o mais baixo que parecia ser o mais velho, foi buscar o caixa pelo braço e levou-o lá para dentro. 

Eu sou o substituto de tesoureiro tenho a segunda chave e sou chamado, disse que não sabia que da outra chave para abrir a porta onde estava realmente o valor e é então que um dos assaltantes talvez o autor, vem cá fora buscar o tesoureiro e até lhe dá 2 socos na cabeça. 

Os movimentos dos criminosos foram anotados por alguém que alertou a guarda da PSP  Delfim Fernandes. Ele entrou, eu vinha aí uns 5 metros atrás quando ouvi os disparos.

Quando o policia entrou o polícia dirigiu-se para a dependência onde se vende os valores selados. O polícia quando foi puxar pela pistola o gatuno liquidou-o logo com a pistola dele.

Eles já tinham revistado as secretárias todas e só se ouve um tiro. Então foi o pânico geral entre eles e entre nós,  foi, portanto, o pavor total,  toda a gente a gritar, eu tinha colegas minhas a chorar e tudo, e eles partiram o vidro dispararam ainda e fugiram.

A Repartição já foi assaltada duas vezes em pleno em fim de semana. A primeira vez em 1975, a outra em novembro último.

Em termos de alarme não temos absolutamente nada. Não temos telefone nem temos sistema de alarme e o polícia de vez em quando é que está cá em serviço quando o comando pode, de resto não temos defesa nenhuma. Palavras da testemunha o Sr. Carlos Cabriz.

As ações armadas das Forças Populares 25 Abril

As Forças Populares 25 Abril foram criadas em 28 de Marco de 1980 com a formação da coligação Força de Unidade Popular.

Consideradas como o braço armado deste partido, as Forças Populares 25 Abril cedo assumiram os assassinatos selectivos e a utilização de violência extrema nas suas acções como práticas inevitáveis.

Foram uma organização armada clandestina de extrema-esquerda que operou em Portugal entre 1980 e 1987. Parte significativa dos seus militantes procediam das antigas Brigadas Revolucionárias. A figura mais conhecida vinculada às Forças Populares 25 Abril foi o capitão de artilharia Otelo Saraiva de Carvalho.

Pese embora no período de charneira entre o fim público das Brigadas Revolucionárias e o surgimento das Forças Populares 25 Abril se verificar o envolvimento de militantes de ambas as organizações primeiro na morte de um agente da Polícia Judiciária em 1978, depois no assassinato na Marinha Grande do “arrependido” do caso PRP José Plácido em 1979 ou ainda este assalto às finanças de Sintra em fevereiro que descrevemos, as primeiras mortes oficialmente imputadas à organização e por esta reivindicadas, verificam-se em Maio de 1980.

Estas decorrem sobretudo de confrontações com elementos das forças segurança e populares durante assaltos a bancos e durante a detenção de militantes.

No dia 20 de abril de 1980 dá-se então a apresentação pública da organização Forças Populares 25 de Abril com o rebentamento por todo o país de dezenas de engenhos explosivos de fraca potência contendo o documento Manifesto ao Povo Trabalhado.

O primeiro ataque conhecido da organização terrorista ocorreu na manhã de 5 de Maio de 1980, no Cacém. Poucas semanas depois do seu aparecimento, as Forças Populares 25 Abril assaltam as dependências bancárias da Caixa de Crédito e Providência e do Banco Totta & Açores.

A ação do grupo terrorista lucrou (recuperação de fundos era o nome usado pela organização para explicar os assaltos a bancos, empresas e viaturas de transporte de valores) cerca de cinco mil contos e provocou a morte de Henrique Hipólito, soldado da GNR.

Para terminar um pequeno excerto do livro – O Terrorismo e as FP 25 anos depois, de José Barra da Costa investigador da Judiciária que liderou a infiltração e caça às FP 25 de Abril.

Em todas as acções, os homens das FP usavam luvas, meias de nylon e gorros. Empunhavam diverso material de guerra que ia das pistolas metralhadoras de calibre 9 mm, às pistolas Walther de 9 e 7,65 mm. Granadas defensivas e ofensivas fizeram também parte do arsenal utilizado. Parte dele roubado às Forças Armadas Portuguesas, outro, comprado em lugares tão distantes como a Argélia ou a Líbia, onde também alguns receberam formação militar.

Nas fileiras das FP-25 Abril militaram ex- operacionais das PRP-BR e das operações especiais portuguesas. O Ultramar português tinha acabado há pouco. Comandos, fuzileiros e outros foram recrutados com sucesso pelas FP-25 de Abril. Há especialistas que afirmam que as últimas acções foram já executadas por grupos isolados da Organização, para proveito próprio.

Para acabar o assunto devo referir que pelo que se apurou, que o assalto às finanças de Sintra não pode ser relacionado directamente com as Forças Populares 25 Abril, mas sim a outras forças populares que existiam, as Brigadas Revolucionárias, por exemplo.

Está por fim descrito tudo o que sei e apurei sobre o assalto à repartição das finanças de Sintra.

A foto da capa do artigo é mais antiga e meramente ilustrativa.

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