Palácio da Quinta da Regaleira

Quinta da Regaleira

A Quinta da Regaleira e o Palácio da Regaleira é o edifício principal da Quinta da Regaleira e noutros tempos mais idos Quinta da Torre ou do Castro ou ainda mais idos Quinta da Cruz. Também é designado Palácio do Monteiro dos Milhões, e, denominação esta associada à alcunha do seu primeiro proprietário, António Augusto Carvalho Monteiro.

O Palácio está situado na encosta da Serra e a escassa distância do Centro Histórico de Sintra estando classificado como Imóvel de Interesse Público desde 2002.

Carvalho Monteiro, pelo traço do arquitecto italiano Luigi Manini, dá à quinta de 4 hectares, o palácio, rodeado de luxuriantes jardins, lagos, grutas e construções enigmáticas, lugares estes que ocultam significados alquímicos, como os evocados pela Maçonaria, Templários e Rosa-cruz. Modela o espaço em traçados mistos, que evocam a arquitectura românica, gótica, renascentista e manuelina.

Localizada em pleno Centro Histórico de Sintra e bem perto do Palácio de Seteais, a quinta beneficia do micro-clima da serra de Sintra, que muito contribui para os luxuriantes jardins e os nevoeiros constantes que adensam a sua aura de mistério.

A documentação histórica relativa à Quinta da Regaleira é escassa para os tempos anteriores à sua compra por Carvalho Monteiro. Sabe-se todavia que, em 1697, José Leite adquiriu uma vasta propriedade no termo da vila de Sintra que corresponderia, aproximadamente, ao terreno que hoje integra a dita Quinta – a esta data parecem remontar, pois, as origens da quinta em questão.

Francisco Alberto Guimarães de Castro comprou a propriedade – conhecida como Quinta da Torre ou do Castro – em 1715, em hasta pública e, após as licenças necessárias, canalizou a água da serra a fim de alimentar uma fonte ai existente.

Quinta da Regaleira em Sintra

Em 1800, a quinta é cedida a João António Lopes Fernandes estando logo, em 1830, na posse de Manual Bernardo, data em que tomou a designação que actualmente possui. Em 1840, a Quinta da Regaleira foi adquirida pela filha de uma grande negociante do Porto, Allen, que mais tarde foi agraciada com o título de Baronesa da Regaleira.

Data provavelmente deste período a construção de uma casa de campo que é visível em algumas representações iconográficas de finais do século XIX.

A história da Regaleira actual principia, todavia, em 1892, alio em que os barões da Regaleira vendem a propriedade ao Dr. António Augusto Carvalho Monteiro por 25 contos de réis (Anacleto, 1994. 241). A maior parte da construção actual da quinta teve início em 1904 e estava terminada em 1910.

A quinta foi vendida a Waldemar d’Orey em 1949 que, sem ter desvirtuado o que tinha sido concebido, procedeu a grandes obras de modo a acolher a sua grande família e profundíssimas obras de restauro, já que a casinha não era cuidada há muito.

Em 1988 a Quinta da Regaleira é adquirida pela empresa japonesa Aoki Corporation e deixa de servir como habitação, sendo entregue ao cuidado de caseiros e permanece fechada ao público.

Em 1997, a Câmara Municipal de Sintra adquire este valioso património, iniciando pouco depois um exaustivo trabalho de recuperação do património edificado e dos jardins. Actualmente, a Quinta da Regaleira está aberta ao público e é anfitriã de diversas actividades culturais.

António Augusto Carvalho Monteiro

O célebre “Monteiro dos Milhões” nasceu no Rio de Janeiro em 1848, filho de pais portugueses, que cedo o trouxeram para Portugal.

Licenciado em Leis pela Universidade de Coimbra, Monteiro foi um distinto coleccionador e bibliófilo, detentor de uma das mais raras camonianas portuguesas, homem de cultura que decerto influenciou, se não determinou mesmo, parte bastante razoável do misterioso programa iconográfico do palácio que construiu para si, nas faldas da serra de Sintra.

Chama-se esotérico a um conhecimento oculto, seja doutrina ou técnica de expressão simbólica, reservado aos iniciados. O esoterismo é, pois, o conjunto de práticas e de ensinamentos esotéricos, no contexto de uma tradição multifacetada que abrange diferentes épocas, lugares e culturas.

A Alquimia, a Maçonaria e os Templários, por exemplo, incorporam teorias, rituais e procedimentos herméticos que se integram no âmbito do esoterismo.

Na tipologia do misticismo judaico, firmado na procura de Deus e na experiência da divindade, o esoterismo baseia-se, fundamentalmente, na lei das correspondências, que visa encontrar, através do recurso à analogia, relações simbólicas entre o divino e o terreno, entre o transcendente e o imanente, entre o visível e o invisível, entre o homem e o universo.

A Maçonaria e a Quinta da Regaleira

A passagem de uma a outra dimensão opera-se em cerimónias de iniciação, por meio de encenações e rituais de carácter mágico, nos quais o neófito recebe o segredo da transmutação, aceita a filiação no grupo de companheiros e acede a um nível espiritual superior.

A Franco-Maçonaria antiga, dita operativa, deriva das confrarias, das corporações, dos agrupamentos profissionais de pedreiros livres e dos construtores das catedrais medievais. À defesa dos interesses profissionais, juntavam os franco-mações preocupações de carácter filantrópico, moral e religioso.

Os grupos maçónicos, organizados em sociedades secretas e reunindo em lojas, foram perdendo o carácter exclusivamente operativo e começaram a aceitar membros estranhos à profissão mas que perfilhavam os mesmos ideais iniciáticos.

O declínio das confrarias origina, por filiação directa, o aparecimento em 1717, em Inglaterra, da Maçonaria moderna, dita especulativa, uma vez que já não existe ligação à prática do ofício de construção, tendo utensílios como o esquadro e o compasso adquirido um valor eminentemente simbólico.

A Maçonaria provocou, praticamente desde o início, a oposição da Igreja Católica, embora muitos dos ensinamentos maçónicos, de inspiração cristã, preconizem a crença nas virtudes da caridade, na imortalidade da alma e na existência de um princípio espiritual superior denominado Grande Arquitecto do Universo.

Grande parte da simbologia maçónica, sobretudo a dos altos graus, inspira-se em correntes esotéricas tais como a alquimia, o templarismo e o rosacrucianismo, inscritas em diversos locais da Regaleira.

Apesar da diversidade de percursos que a Quinta da Regaleira oferece, todos os caminhos podem conduzir a um aglomerado de pedras erguidas, com a aparência de um menir, num dos locais mais belos da mata. E eis que uma curiosa porta de pedra roda impulsionada por um mecanismo oculto e nos faculta a entrada para outro mundo.

É o monumental poço iniciático, espécie de torre invertida que mergulha nas profundezas da terra. A terra é o útero materno de onde provem a vida, mas também a sepultura para onde voltará. Muitos ritos de iniciação aludem a aspectos do nascimento e morte ligados à terra.

De quinze em quinze degraus se descem os nove patamares desta imensa galeria em espiral, sustentada por inúmeras colunas de apurado trabalho, que vão marcando o ritmo e o aprumo das escadarias.

Palácio da Quinta da Regaleira

Os nove patamares circulares do poço, por onde se desce ao abismo da terra ou se sobe em direcção ao céu, consoante a natureza do percurso iniciático escolhido, lembram os nove círculos do Inferno, as nove secções do Purgatório e os nove céus do Paraíso, que o génio de Dante consagrou na Divina Comédia.

Os capitéis dos colunelos enrolam longas folhas de acanto. E lá no fundo, a carga dramática acentua-se. Gravada em embutidos de mármore, sobressai uma cruz templária, aliada a uma estrela de oito pontas, afinal o emblema heráldico de Carvalho Monteiro.

Algumas características da Quinta da Regaleira

As galerias conduzem-nos, em autênticos labirintos, pelo mundo subterrâneo, aqui e além porventura povoado de morcegos. De construção artificial, na sua maioria, estas galerias aproveitam, no entanto, as características geológicas da mancha granítica da Serra de Sintra.

No interior, a abóbada divide-se entre os maciços de rocha mãe, de um granito granular médio, geralmente de cor rosada ou parda, e zonas preenchidas com pedra importada da orla marítima da região de Peniche. É esta pedra, desgastada pelo mar e pelo tempo, que vai contribuir, sobremaneira, para a sugestão de um mundo submerso.

Ao chegarmos ao exterior, esperam-nos a luz e os cenários minuciosamente construídos. São animais fantásticos, artifícios de água em cascata, passagens de pedra que parecem flutuar à superfície dos lagos, ou nuvens silenciosas de vapor que dissimulam as entradas para este universo singular.

A simbólica alquímica parece estar presente em vários locais da Regaleira. Desde logo, na Capela, na pintura da Coroação de Maria por Cristo, na qual a Virgem ostenta, para além das três cores da Obra alquímica – o azul ou negro, o branco, o vermelho ou rubro – uma faixa dourada que poderá simbolizar o Ouro Alquímico.

Também num alto relevo existente nas traseiras da Capela, encontra-se representado um castelo com duas torres, separado por uma zona de labaredas, e uma goela infernal. Trata-se de uma figuração da tri-unidade do mundo e do homem. o mundo superior ou espiritual, o mundo intermédio da alma e o mundo inferior (“ad infero” ou do inferno) material. A torre rubra é o Atanor, ou forno alquímico.

Nas cocheiras, sinais de Alquimia voltam a estar presentes, em duas esculturas que formam símbolos clássicos da Arte de Hermes. a serpente que morde a cauda, simbolizando a Unidade, origem e fim da Obra, e a luta entre as duas naturezas, aqui representada por dois dragões, cada um mordendo a cauda do outro.

Igualmente susceptível de uma leitura alquímica é a gruta ogival, onde Leda, segurando uma pomba na mão, aparece numa escultura à beira de um pequeno lago, enquanto Zeus, disfarçado de cisne, a fecunda bicando-a na perna. Trata-se de uma alegoria pagã ao mito, ou mistério, da Imaculada Conceição, ou concepção, que decorre num lugar escuro e húmido.

Torre invertida da Quinta da Regaleira quinta da regaleira

Parece evidente que a concepção religiosa do mundo que preside à Regaleira assenta no Cristianismo, mas num Cristianismo escatológico, que tem a ver com o fim dos tempos.

Quer recorramos à lição da escatologia cósmica, que prenuncia o fim do universo e da humanidade, quer nos atenhamos à escatologia individual, que assenta na crença da sobrevivência da alma depois da morte, é a mesma ideia obsessiva que encontramos.

Os Templários

É também um Cristianismo gnóstico, apoiado em discursos míticos e em conhecimentos sagrados que prometem a salvação dos fiéis e o retorno dos espíritos. É, enfim, um Cristianismo imbuído de ideais neo-templários, associados ao Culto do Espírito Santo, que encontramos na tradição mítica portuguesa.

Os templários foram monges-soldados, cuja ordem militar, fundada no período das Cruzadas em 1119, visava proteger os lugares santos da Palestina contra o perigo dos infiéis.

Os votos de pobreza e castidade não impediram os Cavaleiros da Milícia do Templo de enriquecer e de desempenhar um importante papel económico e político, tanto no Oriente como na Europa, a ponto de criarem poderosos inimigos, como o rei Filipe IV de França e o Papa Clemente V, que levaram à perseguição e à extinção da ordem em 1314, sob acusações, porventura falsas, de blasfémia e imoralidade.

Em 1317, D. Dinis de Portugal afectou os bens dos templários à Ordem de Cristo, que muitos aceitaram como a sua sucessora.

Desaparecidos os templários não desapareceu o templarismo, cujo espírito, resumido na defesa dos lugares sagrados e na luta contra o mal, renasceu em várias correntes e organizações iniciáticas como sendo a afirmação simbólica da sobrevivência da Ordem do Templo.

A cruz templária no fundo do poço iniciático, a cruz da Ordem de Cristo no pavimento da Capela, bem como todas as outras cruzes dispostas na Capela, testemunham a influência do templarismo no ideário sincrético de Carvalho Monteiro.

Há ainda, na Regaleira, referências rosacrucianas, em alusão à corrente esotérica iniciada no séc. XVII, de tendência cristã, utilizando os símbolos conjuntos da rosa e da cruz. O movimento Rosa-Cruz propunha reformas sociais e religiosas, exaltava a humildade, a justiça, a verdade e a castidade, apelando à cura de todas as doenças do corpo e da alma.

Tornou-se grau maçónico de várias Ordens e, ainda hoje, existem escolas esotéricas e sociedades secretas que pretendem assumir-se como reaparições do mito Rosa-Cruz.

Carvalho Monteiro tinha o desejo de construir um espaço grandioso, em que vivesse rodeado de todos os símbolos que espelhassem os seus interesses e ideologias. Conservador, monárquico e cristão gnóstico, Carvalho Monteiro quis ressuscitar o passado mais glorioso de Portugal, daí a predominância do estilo neomanuelino com a sua ligação aos descobrimentos.

Esta evocação do passado passa também pela arte gótica e alguns elementos clássicos. A diversidade da quinta da Regaleira é enriquecida com simbolismo de temas esotéricos, mas não relacionados com a alquimia, maçonaria e algum simbolismo Templário e Rosa-Cruz.

Alguns pontos de interesse:

A Mata da Quinta da Regaleira

O bosque ou mata que ocupa a maioria do espaço da Quinta, não está disposta ao acaso. Começando mais ordenada e cuidada na parte mais baixa da quinta, mas, sendo progressivamente mais selvagem até chegarmos ao topo. Este disposição reflecte a crença no primitivismo de Carvalho Monteiro.

Patamar dos Deuses

O Patamar dos Deuses é composto por 9 estátuas dos deuses greco-romanos. A mitologia clássica foi uma das inspirações de Carvalho Monteiro para os jardins da Regaleira.

regaleira patamar dos deuses quinta da regaleira

Poço Iniciático ou Torre Invertida

Uma galeria subterrânea com uma escadaria em espiral, sustentada por colunas esculpidas, por onde se desce até ao fundo do poço. A escadaria é constituída por nove patamares separados por lanços de 15 degraus cada um, invocando referências à Divina Comédia de Dante e que podem representar os 9 círculos do inferno, do paraíso, ou do purgatório.

Segundo os conceituados ocultistas Albert Pike, René Guénon e Manly Palmer Hall é na obra ‘A Divina Comédia’ que se encontra pela primeira vez exposta a Ordem Rosacruz.

No fundo do poço está embutida em mármore, uma rosa dos ventos (estrela de oito pontas. 4 maiores ou cardeais, 4 menores ou colaterais) sobre uma cruz templária, que é o emblema heráldico de Carvalho Monteiro e, simultaneamente, indicativo da Ordem Rosa-cruz.

O poço diz-se iniciático porque se acredita que era usado em rituais de iniciação à maçonaria e a explicação do simbolismo dos mesmos nove patamares diz-se que poderá ser encontrada na obra Conceito Rosacruz do Cosmos.

A simbologia do local está relacionada com a crença que a terra é o útero materno de onde provém a vida, mas também a sepultura para onde voltará. Muitos ritos de iniciação aludem a aspectos do nascimento e morte ligados à terra, ou renascimento. A existência de 23 nichos localizados por debaixo dos degraus do poço iniciático representava um dos muitos mistérios da referida construção.

No dia 29 de Dezembro de 2010, o professor Gabriel Fernández Calvo da Escola Técnica Superior de Engenheiros de Caminhos, Canais e Portos da Universidad de Castilla-La Mancha em Ciudad Real, quando visitava o poço acompanhado de outros professores da UCLM, observou que os 23 nichos não estão colocados por acaso, pois se encontram agrupados em três conjuntos de 17, 1 e 5 nichos separados entre si à medida que se desce ao fundo do poço.

Esta organização não é aleatória e provavelmente se refere ao ano 1715 em que Francisco Albertino Guimarães de Castro comprou a propriedade (conhecida como Quinta da Torre ou do Castro) em hasta pública.

O poço está ligado por várias galerias ou túneis a outros pontos da quinta, a Entrada dos Guardiães, o Lago da Cascata e o Poço Imperfeito. Estes túneis, outrora habitados por morcegos afastados pelos muitos turistas que visitam o local, estão cobertos com pedra importada da orla marítima da região de Peniche, pedra que dá a sugestão de um mundo submerso.

A Capela da Santíssima Trindade

Uma magnífica fachada que aposta no revivalismo gótico e manuelino. Nela estão representados Santa Teresa d’Ávila e Santo António. No meio, a encimar a entrada está representado o Mistério da Anunciação – o anjo Gabriel desce à terra para dizer a Maria que ela vai ter um filho do Senhor – e Deus Pai entronizado.

No interior, no altar-mor vê-se Jesus depois de ressuscitar a coroar uma mulher que pode ser Maria ou Madalena (de uma maneira mais contraditória). Do lado direito Santa Teresa e Santo António repetem-se, desta vez em painéis de mosaico.

Do lado oposto um vitral com a representação do milagre de Nossa Senhora da Nazaré a D. Fuas Roupinho. No chão estão representados a Esfera Armilar ou Globo Celeste e a Cruz da Ordem de Cristo, rodeados de pentagramas (estrelas de cinco pontas).

Palácio da Quinta da Regaleira Capela
Quinta da Regaleira Capela

A Torre da Regaleira

Foi construída para dar a quem a sobe a ilusão de se encontrar no eixo do mundo.

O Palácio

O edifício principal da quinta é marcado pela presença de uma torre octogonal. Toda a exuberante decoração esteve a cargo do escultor José da Fonseca.

Assim acaba a riquíssima história da Quinta da Regaleira. Decerto que mais haveria mais para contar, mas penso que demos um grande contributo no entendimento, história e mistérios desta magnifica quinta em Sintra.

Quinta da Regaleira
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