O Assalto ao Comboio de Sintra – Noticia do Diário de Lisboa – 7 janeiro de 1983
Cinco indivíduos armados e embuçados assaltaram ontem à noite o “comboio da massa” da Linha de Sintra, escapando com o cofre que transportava o produto das bilheteiras das estações entre aquela estação e a da Cruz da Pedra, na ordem dos seis mil contos.
Em condições normais, o assalto ao Comboio de Sintra poderia render aos seus autores cerca de vinte mil contos. A actualização das tarifas dos transportes e o facto de os passes de dezembro serem válidos até hoje evitou prejuízo maior à CP.
Os assaltantes fugiram num carro de cor vermelha, com tejadilho preto, na direcção da serra de Monsanto. O homem que guardava o cofre pequeno transportado no furgão do comboio ficou ferido durante o assalto. “Só faltaram os cavalos para ser um filme de ‘cowboys”, afirmavam esta madrugada populares no local, enquanto pessoal de vias e obras da CP desobstruiu a linha, cuja circulação ficou normalizada às oito horas.
O Assalto ao Comboio de Sintra – Descrição
Cinco indivíduos armados e embuçados apoderaram-se ontem à noite de um cofre da CP transportado no furgão de um comboio que saiu de Sintra às 22h27 e passou na estação da Cruz da Pedra às 23h08. O assalto não durou mais de três/quatro minutos e a mudança da agulha do carril daquela estação terá sido obra para cinco minutos.
Em menos de dez minutos, aquela paragem dos Caminhos de Ferro foi palco do mais sensacional ataque verificado em Portugal nos últimos anos. O comboio de quatro carruagens transportava no seu furgão o produto da receita da venda de passes sociais e bilhetes de ontem e deveria ter ocorrido no dia 31 de dezembro caso o preço dos transportes não tivesse sido ajustado e aumentado nos últimos dias.
Por via da decisão do Governo, o assalto, que estaria preparado para o último dia de 1982, sofreu um atraso de cinco/seis dias e não terá rendido aos seus autores a maquia prevista.
Os atacantes, que dois jovens não identificados afirmam terem sido cinco ou seis (admitindo que um estaria no carro em que o bando escapou para a serra de Monsanto), dispararam vários tiros que puseram a área da Cruz de Pedra em alvoroço.
O Assalto de Mestres
O Assalto ao Comboio de Sintra ocorreu pouco depois das 23 horas. A composição saíra de Sintra antes das dez e meia da noite com a receita do dia daquela estação. Recolheria o produto das estações seguintes até à Cruz da Pedra, reforçado com a venda de passes sociais pelo facto do selo de dezembro vigorar até hoje, devido aos aumentos das tarifas dos transportes.
A desmontagem da caixa do carril que descarrilou o comboio foi impecável, ouvimos de um dos trabalhadores da CP. Os dois/três assaltantes que, provavelmente com uma alavanca, mudaram a agulha, percebiam do assunto. “Nem se enganaram na caixa”. As duas carruagens da frente ficaram assentes no empedrado da linha. As duas últimas não chegaram a descarrilar e, pouco antes das três horas da madrugada, eram separadas da composição sem dificuldades de maior.
Este comboio transportava no furgão à guarda de um agente da PSP à paisana as receitas de doze horas das estações entre Sintra e a Cruz de Pedra.
O cofre com a receita apurada pelas estações da linha de Sintra até à Cruz da Pedra foi roubado ao agente da PSP que o guardava, trajando à civil, sob a ameaça de uma espingarda de canos serrados e pistolas por três assaltantes, que irromperam no furgão sem qualquer possibilidade de defesa para o homem. “Se estivesse fardado teria sido morto”, terá afirmado o guarda, ferido durante o assalto, ao ser transportado para o Hospital de S. José numa ambulância.
José Augusto Amorim, de 53 anos, natural de Caminha e residente em Lisboa, reagiu aos atacantes quando estes retiravam com o cofre (pequeno) e seria atingido com dois tiros de uma caçadeira de canos serrados. Não teve tempo de fazer frente aos assaltantes com a pistola que usa em serviço, não só pela desproporção numérica como pela pouca eficácia da sua arma.
Em qualquer país da Europa, o transporte de receitas avultadas é assegurado por mais de dois especialistas no tiro, armados de espingardas e G-3. Talvez por isso, entre os populares que acorreram à Cruz da Pedra pouco depois do assalto, se ouvisse dizer que a operação fora fácil.
Foi, contudo, preparada até à exaustão. Todos os pormenores foram ensaiados. Nada falhou. Entre a população da área havia quem lembrasse os movimentos suspeitos, ontem e antes, de elementos na linha, preparando porventura o “grande assalto”.
Um informador da CP afirmou que o montante entre 14 a 20 mil contos do assalto noticiado pelos matutinos de Lisboa era “extremamente elevado”, pecando por excesso. De acordo com as Relações Públicas da CP, as verbas adiantadas “são inflacionadas”, mas deverão ter ultrapassado os dois mil contos inicialmente apontados pelo guarda José Augusto Amorim.
Delfim dos Santos Sousa – o principal suspeito
O preso mais antigo das cadeias portuguesas foi considerado o cérebro e líder do bando e condenado a 20 anos de cadeia, o máximo na altura. Está preso desde 25 de março de 1983 e é o recluso com mais tempo de cadeia em Portugal.
Com equipamento militar e sempre munidos com espingardas automáticas G3 e granadas de guerra, Delfim era o cabecilha de uma quadrilha de assaltantes à mão armada que alarmou e aterrorizou o país nos anos 1980.
Detém também o recorde de páginas no registo criminal com 64 páginas e 68 processos-crime. Foi condenado a 266 anos de prisão reduzido para 20 anos. Sempre se declarou inocente de todas as acusações.
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